Terça-feira, Dezembro 14

Festas

Aquele tilintar penetrava em seus ouvidos. O sino do Papai-Noel magrelo parecia uma agulha, já não muito afiada, sem tanto poder de perfuração, forçando seus tímpanos na tentativa de rompê-los. Irritante. Não menos, porém, que caminhar sob o sol de dezembro. E sem os óculos escuros. Carlos amaldiçoava aquele momento tão vil do ano: as compras de Natal.

A mulher gentilmente o obrigava a acompanhá-la. “Não consigo fazer tudo sozinha, né?” E, pior, os tempos de crise os tiraram dos confortos do shopping: ar condicionado, estacionamento coberto, relativa tranqüilidade. Tudo fora trocado pelas lojas de rua, comércio popular, mais barato e completamente cheio.
Andar por aquelas ruas nessa época não é para qualquer um. É praticamente um treinamento militar. O andar aos solavancos pelos encontrões com os que vinham em sentido contrário, as poças d’água no meio fio, as calçadas esburacadas. Isso quando as barracas dos camêlos permitiam. Sem falar na sujeira. Caminhar por aqueles lugares era como estar numa guerra. Lá, só os mais fortes – “e os mal-educados”, pensava – sobreviviam.

As lojas eram como bunkers a serem penetrados. Cada uma utilizava sua estratégia para espantar as pessoas. Palhaços, mágicos, som nas alturas. Vale tudo. E mesmo assim elas se debatiam para alcançar os tabuleiros com as roupas todas ali, emboladas.

Numa parada para tomar uma água e comer algo, Carlos olhava sem ânimo para a coxinha em suas mãos e pensava desconsolado “E ainda tem o Natal”.