Terça-feira, Setembro 21

Vida de mulher

Muitos a consideravam masculina. Demais, até. Gostava de futebol. Adorava ler a Playboy (sim, ler). Tomar uma cerveja no boteco comendo um pedaço de pizza de um queijo qualquer, daqueles que deixam um brilho peculiar nos lábios, então, era orgásmico.

Não estava nem aí para o que pensavam dela. Pelos corredores da empresa costumava ouvir os comentários maldosos caídos no chão. “Idiotas”, gritava mentalmente. Afinal, qual era o problema de ser a zagueira mais temida pelos times das empresas adversárias no campeonato anual. Para isso ela servia, né? Marcar forte, chegar junto, parar a jogada.

O que mais incomodava, principalmente aos homens, porém, era sua habilidade na direção. Ninguém era páreo. Trocava a marcha no tempo sem usar a embreagem, sua tomada de curva era perfeita (o modo como fazia a tangência era quase um balé) e, sem pestanejar, sabia o que fazer se o carro desse problema. Não tinha mecânico que a enganasse.

Apesar de tudo era feliz. Ganhava razoavelmente bem, o suficiente para luxos deliciosos como viajar à Europa e poder assistir Brasil e Inglaterra em Wembley antes da demolição. Morava em um apartamento espaçoso e adorava seus dois cachorros. Até do marido gostava. Sentia especial prazer em gritar pra ele na cozinha “Benhê, traz mais uma!”.